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Artigos • 07 ago, 2019

Consenso ou caos ( Delfim Neto)


As últimas semanas vêm explicitando as consequências da combinação heterogênea de cidadãos que se juntaram para eleger o presidente Bolsonaro no segundo turno da eleição de 2018.

Primeiro, um núcleo “duro”, uma óbvia minoria, que tem real afinidade com seus preconceitos, detesta todas as diferenças identitárias (étnicas, religiosas etc.), defende uma imaginária “nova política” que recusa a verdadeira, o exercício da tolerância e a busca do consenso que estimula a integração social, e flerta impor sua “visão de mundo” através de uma democracia iliberal, como se não existisse a Constituição de 1988 e o seu controle pelo Supremo Tribunal Federal.

Àquele juntou-se, em “legítima defesa”, um segundo e significativo, mas também minoritário, grupo de cidadãos desiludidos com os males feitos de 13 anos de laxismo da administração do PT, postos a nu pela operação Lava Jato. Este grupo foi enriquecido pela adesão entusiasmada do sistema econômico nacional em respeito à promessa do ministro Paulo Guedes (o famoso “posto Ipiranga” de Bolsonaro) de que iriam implantar uma política libertária (vamos tirar o Estado do cangote do setor privado brasileiro).

Com esse apoio, Bolsonaro foi eleito com 55% dos votos válidos. É impossível saber qual o peso de cada grupo, mas é possível inferi-los, pela importância de seu partido (o PSL), na formação da Câmara Federal.

Pois bem, o PSL representa pouco mais de 10% da Câmara e está longe, portanto, de poder garantir a governabilidade do país, sem aliar-se (republicanamente, como em todas as repúblicas democráticas) a outros partidos para construir uma maioria estável, que sustente um programa estabelecido consensualmente. Sem isso não haverá harmonia entre os poderes e, portanto, não haverá governo.

Felizmente, o protagonismo assumido pela Câmara e pelo Senado tem salvo o dia e mostra que um programa consensual é possível desde que o Executivo (que é, obviamente, uma minoria) não tente impor sua vontade à maioria.

A solução será muito mais rápida se o presidente entender que pode muito, mas não tudo, e que sua política diversionista, que coloca a cada dia falsos problemas (como o do clima) e recusa toda diversidade, atrapalha a solução dos problemas reais e dificulta o trabalho de alguns ministros que têm se revelado excelentes.

Mesmo sendo deselegante, o comportamento de Bolsonaro pode ser franco a ponto de ser abusado, mas não é esse o problema. O seu problema é ignorar, sistematicamente, as evidências empíricas na formulação das políticas públicas destinadas a atender aos seus propósitos.

*Publicado na Folha de S.Paulo




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