Sempre há os definidos politicamente, mas a maioria pende de um lado para outro, de acordo com a conjuntura

 

A ideologia da classe média varia com o dólar, costumo dizer por humor. A abertura da economia, associada ao real valorizado, ampliou o acesso a importados e a viagens internacionais. Bugigangas asiáticas inundaram o mercado. Com gosto não menos duvidoso, preferia-se comprar em Miami o aqui disponível em qualquer shopping. No período, o PT reelegeu presidente três vezes. Bairros típicos de classe média, como Bonfim, Cidade Baixa e Menino Deus, eram um mar de bandeiras vermelhas. Os tempos do “Lulinha paz e amor” acabaram quando o dólar se valorizou 40% em curto período, depois de um piso em R$ 1,56. Em agosto 2011 começou o fim do namoro. Meses depois vieram os protestos de rua e o desfecho foi o impeachment de Dilma.

Há uns 10 anos comemorou-se o aparecimento de “nova classe média”. Outro equívoco, pois não era nem nova, nem classe, nem média. Trata-se de mero agregado estatístico que agrupava setores da velha classe trabalhadora de até dois salários mínimos que, com a elevação destes em termos reais, aumentou sua participação na renda, muitos saindo da informalidade. Foram quase 50 milhões que, de fato, pularam de patamar de consumo, fenômeno não desprezível – mas longe do que no Brasil chamamos de classe média. Os emergentes (provindos das “classes” D e E), assim como os caminhoneiros, são mais afetados pelo dólar comercial, o qual incide nos combustíveis, alimentos e transportes urbanos e de longa distância. Já a classe média, tal como entendemos, abrange estratos de renda mais acima – e com olho também no dólar turismo. Com este acima de R$ 5,00, há outro teste para o Covid-19: ver se minha hipótese é mera brincadeira ou é robusta empiricamente.

Fonte Zero Hora

Por Pedro Dutra Fonseca, professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS