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Artigos • 14 nov, 2020

Impasse eleitoral já foi motivo de retrocesso histórico nos EUA


(por Vanderlei Rebelo) – 

Os Estados Unidos já viveram um impasse eleitoral semelhante ao atual e seu desfecho teve consequências catastróficas para o país, abrindo caminho para o apartheid racial e atrasando em pelo menos um século a luta pelos direitos dos negros. Foi nas eleições de 1876, justo quando os norte-americanos comemoravam cem anos da sua Declaração de Independência.

O candidato do partido Democrata, Samuel Tilden, ganhou as eleições no colégio eleitoral e no voto popular, mas seu oponente republicano, Rutherford Hayes, estava determinado a não aceitar o resultado. Ele pediu recontagem dos votos na Flórida, na Luisiana e na Carolina do Sul.

Instaurado o impasse, foi formada uma comissão eleitoral para buscar um acordo. Aí é que Hayes – que entrou para a história como Rutherfraude Hayes – fez a proposta que se revelaria irrecusável para os democratas. Ele seria declarado vencedor, sob o compromisso de, ao assumir a presidência, desmobilizar as forças militares da União instaladas no sul desde o final da Guerra Civil, em 1865.

Como lembra a historiadora Jill Lepore (Estas Verdades – a história da formação dos Estados Unidos, editora Intrínseca), os direitos políticos dos negros só estavam assegurados no Sul escravocrata “sob a mira de uma arma”.

Lembrete histórico: os democratas eram, então, o partido da aristocracia agrária que dava sustentação à escravidão, amplamente majoritário no Sul derrotado na guerra civil, e os republicanos – mais fortes no Norte industrializado – defendiam a abolição (o que sugere uma ligeira inversão dos valores que os dois partidos representam hoje).

Assim, graças à barganha proposta por Hayes, os democratas perdiam a presidência, mas ganhavam algo que lhes era muito mais valioso: a liberdade para institucionalizar um odioso regime de segregação, que só começaria a ser desmantelado – e só muito parcialmente – em 1965, quando o presidente Lyndon Johnson aprovou a nova legislação de direitos civis.

A reação dos sulistas ao fim da escravidão, decretada por Abraham Lincoln em 1863, começou já em 1866 com a criação da Ku Klux Klan, cujos membros se fantasiavam de fantasmas para representar soldados confederados mortos na Guerra Civil que “ressurgiam” de seus túmulos para aterrorizar os negros recém-libertos.

Mas, enquanto as tropas militares unionistas permaneceram no Sul, a Klan semeou mais ódio que medo. Cientes de seu direito de votar, os negros foram às urnas em massa: saíam de casa em grupos para se garantir contra os supremacistas brancos e caminhavam até dezenas de quilômetros para chegar aos locais de votação. Não apenas votavam como também foram votados: alguns deles se elegeram prefeitos e representantes.

Isso começou a acabar em 1876. De mãos livres, a Klan linchou e enforcou mais de 3 mil mulheres e homens negros só entre 1882 e 1930. Os negros eleitos para cargos públicos foram sumariamente afastados.

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