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Artigos • 03 jan, 2020

“Instituto da Prescrição Penal: o novo vilão” (artigo)


Não é novidade alguma que o país se encontra em compasso de espera, na expectativa da decisão final a ser proferida pelo STF, no tocante à malfadada “possibilidade” de prisão após a condenação em segunda instância.

Sobre essa questão, cumpre dizer que o STF, ao alterar o seu posicionamento em 2016, acabou incorrendo em gravíssimo erro interpretativo, na exata medida em que a nossa Constituição Federal, no seu artigo 5º, inciso LVII, não dá margem para grandes desvios, haja vista ser clara a redação da referida Norma Constitucional, no sentido de que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Contudo, em que pese o rematado equívoco cometido em 2016, quando o entendimento mais garantista até então adotado foi substituído por verdadeira burla à presunção de inocência, fato é que a sociedade em geral, majoritariamente, passou a enxergar a prisão após a condenação em segunda instância como um bálsamo miraculoso, que seria capaz de colocar um fim no tal “mito da impunidade” e na criminalidade em geral. De toda forma, fruto de um equívoco ou não, fato é que a malfadada execução antecipada da pena caiu no gosto popular.

Diante desse quadro, eis que, pouco mais de dois anos depois, a nossa mais alta Corte vê-se na contingência de deliberar a respeito do tema, mais uma vez, agora em sede de ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs ns. 43 e 44). Apenas para esclarecer, a ADC é uma modalidade especifica de ação, que tem expressa previsão constitucional (art. 102, inciso I, “a”, da CF/88), voltada para analisar e declarar a constitucionalidade de uma determinada lei ou normativo federal. Ou seja, trata-se da via processual própria para a discussão do tema, já que, em real verdade, o que está em debate é o alcance da cláusula pétrea que prevê a presunção de inocência.

De todo modo, uma vez iniciado o julgamento, verifica-se a enorme possibilidade de que, ao final, o STF venha a rever o absurdo por ele criado em 2016, para assim banir, de uma vez por todas, a equivocada prisão após condenação em segundo grau.

Ocorre que, se assim o fizer, o STF estará adotando uma posição manifestamente impopular, embora juridicamente acertada.

Diante da tempestade que se aproxima, eis que, no último dia 28 de outubro de 2019, o Ministro Dias Toffoli, atual Presidente do STF, encaminhou, ao Senado Federal e à Câmara dos Deputados, uma proposta de alteração do Código Penal, cujo objetivo, basicamente, é de suspender o curso do prazo prescricional após a condenação do acusado em segunda instância.

Ou seja, após desvirtuarem o texto constitucional, o que provocou a prisão indevida de milhares de acusados antes do trânsito em julgado, eis que surge a nova vilã, qual seja, a prescrição.

Nesse ponto, é preciso lembrar que a principal razão de ser da prescrição é, justamente, evitar que o cidadão permaneça sob o jugo do Estado, ou como investigado ou como acusado, no aguardo de uma decisão, indefinidamente.

Atualmente, é preciso pontuar que, mesmo havendo o prazo prescricional, nossas Cortes Superiores levam, em média, dois anos ou mais para julgar um único recurso. Se assim é com a possibilidade de prescrição, imaginem só o que ocorrerá se a prescrição for “congelada”. Seguramente, os processos que tramitam no STJ/STF serão julgados em tempo ainda mais elástico, já que a “eternidade” será o limite.

Desta forma, “congelar” a prescrição não é a saída mais adequada para apaziguar a atual impopularidade do STF. Não se pode admitir que, para arrumar um problema (a prisão em segundo grau), crie-se outro, qual seja, permitir que o processo se torne perpétuo no âmbito dos STJ e STF.

Já passou da hora de termos a merecida segurança jurídica, sem invenções ou distorções da lei. Alterar os regramentos inerentes ao instituto da prescrição penal não nos trará benefício algum, uma vez que, no final da história, o único prejudicado voltará a ser o jurisdicionado, que poderá ter o seu processo estendido ad aeternum, até o trânsito em julgado.
Enfim, pelo bem da razoabilidade e do bom senso, deixem a prescrição em paz!

Euro Bento Maciel Filho – mestre em Direito Penal – Correio do Estado




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