A verdade é que a ciência tem me decepcionado no combate à peste do coronavírus. O que os cientistas dizem para nós, basicamente, são duas coisas:

São recomendações que a minha avó, dona Dina, faria, se estivesse viva nestes tempos estranhos. Já sei até qual será a próxima recomendação da ciência, quando enfim estivermos saindo do isolamento:

“Leva um casaquinho!”.

Repare num pequeno poema que circulava entre a população em meio à gripe espanhola, em 1918:

“Perdigotos – Que perigo!
Se estás resfriado, amigo,
Não chegues perto de mim.
Sou fraco, digo o que penso.
Quando tossir, use o lenço
E, também, se der atchim.
Corrimãos, trincos, dinheiro
São de germes um viveiro
E o da gripe mais frequente.
Não pegá-los, impossível.
Mas há remédio infalível,
Lave as mãos constantemente.
Se da gripe quer livrar-se
Arranje um jeito e disfarce,
Evite o aperto de mão.
Mas se vexado consente,
Lave as mãos frequentemente.
Com bastante água e sabão.
Da gripe já está curado?
Bem, mas não queira, apressado,
Voltar à vida normal.
Consolide bem a cura,
Senão você, criatura,
Recai e propaga o mal.”

“Lavar as mãos.” “Usar lenços.” “Não tentar voltar à vida normal antes do tempo.” Providências velhas de cem anos, e ainda válidas. Minha avó sabia muito.

***

Houve um vilarejo português que atravessou incólume aquela pandemia, de 1918. Foi a Freguesia de Amieiro, engastada num doce vale ao norte da pátria-mãe.

Amieiro, que nem existe mais com esse nome, tornou-se conhecida como “a terra em que não morreu ninguém”. De fato, caía gente em toda a volta da cidadezinha, mas seus habitantes nem infectados foram.

Por quê?

O que Amieiro tinha, que a salvou da peste?

Segundo seus habitantes, que eram cerca de 500, o segredo do lugarejo era o fogo. Ou, antes, as fogueiras.

Durante o dia, cada morador saía pelos campos do entorno e reunia todo tipo de ervas aromáticas, como o alecrim, o zimbro, o trovisco, o pinho. Eram formadas ramas dessas plantas e deixadas ao sol. No fim da tarde, badalava o sino da igreja – era o sinal para que todos os moradores ateassem fogo aos ramos de ervas, que eram colocados diante das casas. Amieiro ficava completamente tomada pela fumaça cheirosa por horas e os moradores se sentiam protegidos como se estivessem debaixo do manto de Nossa Senhora.

Será que o vírus tem medo da fumaça e do odor de ervas boas? Mais um trabalho de investigação para os cientistas.

Mas há outra possível razão do sucesso de Amieiro: sua localização geográfica. Cercada por sete colinas, como Roma, a cidade gozava de uma espécie de isolamento natural do mundo exterior. Assim, manteve-se a salvo das más influências e dos maus fluidos.

De toda maneira, li que agora, nesta nossa época de vírus novo e insidioso, os habitantes da região estão imitando seus antepassados e acendendo fogueiras diante de suas casas, como prevenção.

Acho uma boa ideia. Afinal, nossas avós tinham razão. E quem diz não sou eu, um saudoso neto: é a ciência.

Fonte – Zero Hora