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Blog do Manoel Afonso

Opinião e atitude no Mato Grosso do Sul

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Artigos • 07 ago, 2018

O brasileiro unido é… horrível


Quando ouço que “do Brasil só salva o povo”, dá até arrepio. Salva não. Poucas pessoas salvam o único fio de esperança que podemos ter. Mas o povo, considerado em proporção característica da coletividade, não. Não somos, no Brasil, uma nação. O que difere “povo” de nação é o fato de que um aglomerado de pessoas desunidas em propósitos e preocupadas com a sobrevivência em um determinado território, sobre o qual pesa a soberania do ente estatal, chama-se povo. Agora, esse mesmo povo, unido por laços étnicos, de língua e aspirações comuns, à consecução do bem comum, pode ser chamado de nação.
É isso que nos diferencia de alguns países. O sujeito que diz ser o brasileiro um “povo” que sofre, mas que é aguerrido e lutador – de duas, uma -, ou está certo, ou com dó. Somos nação somente quando um monte de jogadores sobe num avião, ao custo por pessoa de quase 1 milhão, mas logo perdemos a união quando o centroavante que pôs no cabelo um monte de macarrão, vai ao chão. O termo “nação”, só nos empresta o ditongo para isso.
Confundimos democracia com permissividade e acreditamos que torcer para político ladrão é “respeitar opiniões”. Confundimos pluripartidarismo com sacanagem para ganhar tempo de televisão. Confundimos cortesia com aluguel da alma. Estudamos história do Brasil e achamos linda a vida do colonizador (fazemos novela disso e a exportamos). Somos palco de uma diversidade riquíssima de ensinamentos, mas testemunhamos atos de discriminação e preconceito em cada esquina. O brasileiro vive em um país preconceituoso, cujo ato brota no olhar e não só em atitudes muitas vezes. O poder ideológico do ente estatal impõe formas de pensar a todo instante, ora renunciando receita pública para incentivo do consumo, ora difundindo ideias. E o brasileiro rotula o outro brasileiro achando que sabe o que é esquerda ou direita – mas, perdido, esquece de acionar a seta quando vira. Vira tonto quando diz que não há mais político honesto, e mais tonto ainda quando acredita em tudo o que o político diz.
Diz que o brasileiro tem bom coração e por isso nunca se cansa de lutar, só porque para o caminhãozinho uma semana no acostamento e pede pelo amor de Deus para o presidente abaixar o preço do diesel – a troco de nada. Morre abraçado com o engodo ao acreditar que o “jeitinho” é sua maior virtude e o acordar cedo, sua maior realização. Acha que os jogadores de futebol não têm nada a ver com a corrupção, mas se esquece que o ex-presidente da CBF está preso nos EUA e o último foi banido do futebol. Acha que torcer para um monte de atletas mimados e milionários, comandados pela leitura de livros de autoajuda, é tornar o povo, uma nação. E ferrar a economia do país para construir estádios padrão Fifa para a Copa de 2014, o maior evento de futebol do mundo, ou, para edificar uma estrutura olímpica, é um presente para nosso “povo sofrido”.
Fechar o comércio em dia de jogo da seleção brasileira na Copa e torcer para o patrão dispensar mais cedo, não é considerado assar o pão e erguer a lona do circo de um povo que esquece da miséria só nesse dia? Tudo certo? Ah, mas somos penta… e os jogadores e o futebol não têm culpa da miséria… Não? Geram empregos, inserem o torcedor nos mecanismos de produção de riqueza? Há quem diga que sim. Duvido! O ente estatal constrói hospitais para médicos (expressão de Franco Cipriani), não literalmente, mas como se fosse, quando o assunto é a utilização do dinheiro público e achamos que está tudo bem: continuamos votando como se jogássemos a sujeira embaixo do tapete. Nada se aproveita? Não é isso.
A ideia é a seguinte: unidos como um povo, com aspirações fúteis como exposto acima, em uma visão coletiva, somos fracos. Sozinhos, como seres humanos, merecemos respeito. Unidos, com aspirações comuns, de um País melhor, não considerando válidas as permissividades, somos uma nação. E contra o sentimento nacional não há adversário forte. Falta muito ainda para sermos considerados uma nação que não vive do pão e circo, do assistencialismo e das migalhas distribuídas a um povo do “cada um por si”, do individualismo e da solidariedade por pena – não por convicção.
Temos a oportunidade diária para transformar a essência humana e honesta do brasileiro considerado individualmente, em aspirações e atitudes nacionais. Em outubro próximo talvez tenhamos um exemplo disso. Isso se não nos for apresentado um cardápio de dar nojo e de doer a consciência quando apertado o botão.
Rogério Piccino Braga é advogado, doutorando e mestre em direito constitucional pela ITE de Bauru, professor colaborador da Faculdade de Direito da Universidade Estadual do Norte do Paraná (Uenp), professor da Unopar/Bandeirantes-PR, membro efetivo da Comissão Especial de Ensino Jurídico da Seccional da OAB-SP e membro do Conselho Editorial do “Comércio”.



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