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Política • 24 jun, 2019

O MÍNIMO DA FELICIDADE (ARTIGO)


Os sofrimentos e desencontros ainda marcarão a ascensão para uma forma melhor de ocupação harmônica do planeta

Disse um professor meu, sumidade em filosofia e antropologia: “A idade da humanidade, analisada em seu conjunto, pode ser considerada hoje de 17 anos, ainda longe da maturidade que será conquistada”. Partindo dessa constatação de um iluminado, pode-se entender que apenas uma reduzida parcela dos mais de 7 bilhões de seres humanos que povoam a terra alcançou em nossa época um potencial de ação diferente daquele de um menor de idade.

Compreende-se que os sofrimentos e desencontros ainda marcarão a ascensão para uma forma melhor de ocupação harmônica do planeta.

As sementes de uma humanidade amadurecida, entretanto, já estão brotando e podem ser notadas pelo observador mais atento.

Serve de parâmetro o passado. No século I depois de Cristo, época do imperador Augusto, a população da Terra era de cerca de 300 milhões, com expectativa de vida de 35 anos; demorou um lapso de 17 séculos para atingir 600 milhões, com expectativa de viver 42 anos.

No albor do século XVIII, iniciou-se a fase dita de industrialização, um fenômeno portentoso de aceleração. A capacidade de produzir bens em grande escala alterou os costumes e o “modus vivendi”, possibilitando alongar a vida e lhe dar mais conforto, ao menos para uma parte mais abastada.

O avanço em apenas 250 anos levou os habitantes do planeta a se quadruplicar, alcançando 2,5 bilhões em 1950. A velocidade máxima atingida pelo homem passou de 30 km/h a uma velocidade supersônica. A sonda russa tendo a bordo o astronauta Gagarin deu uma volta inteira na terra nos anos 60 em apenas 108 minutos.

Os avanços da ciência em todos os sentidos, no período de 70 anos, fizeram a população ultrapassar o fantástico limiar de 7 bilhões. Foram suficientes apenas três gerações, para conquistar uma expectativa de vida acima de 70 anos.

Estudos recentes estimam que no ano 2050 teremos 9,6 bilhões de seres humanos dividindo o planeta, com prevalência de indivíduos “over” 60 anos e uma vida média de 90.

Nos países mais desenvolvidos da Europa, a longevidade já é de 80 anos para os homens e 85 para as mulheres, como na Itália.

Pode-se prever que muitos dos jovens atuais chegarão aos 100 anos ainda com saúde e lucidez.

Embora os sinais de uma necessidade de mudança de paradigmas sejam evidentes, a humanidade continuará por um tempo indefinido na luta para acumular, para “ter mais”. Só depois de vários desastres, que custarão caro, se perceberá que as transformações, nunca antes ocorridas em tão curto período, precisam ser levadas a sério.

A humanidade “adolescente”, distraída, está tomada de uma disputa de todos contra todos, perdeu a visão de unidade de espécie, confundindo equivocadamente a felicidade com aquilo que se acumula.

O “ter” se substituiu ao “ser”, que deverá voltar a prevalecer no futuro, extinguindo-se a síndrome ou doença de Midas, o rei que acabou perecendo de fome porque sua mão se especializou apenas em gerar ouro. O trabalho e o dinheiro passaram equivocadamente a ser o fim, e não o meio, de vida. O rabo (dinheiro) passou a abanar o cachorro (homem).

Mesmo sem a vidência de Nostradamus, pode-se ver que os acontecimentos conjuram para uma extraordinária mudança. Provavelmente comparável ao extinguir-se de uma espécie e ao nascer de outra. Isso já aconteceu com os Cro-Magnon mais aperfeiçoados e hábeis, que substituíram no planeta os Neandertais, toscos e primitivos.

Estamos na iminência de uma mudança radical, ditada pela necessidade da evolução, ou mais simplesmente pela sabedoria do planeta, da mãe Terra, que é o organismo que nos dá a vida?

Resta que em quatro gerações a expectativa de vida dobrou e avança, ao passo que não se vivem mais 35 anos, e sim 85 anos.

Enxergam-se nos últimos tempos alguns fenômenos premonitórios, como o minimalismo, que atinge um número cada vez maior de jovens, que fazem questão de reduzir seus consumos, o espaço ocupado, as energias consumidas. Desabrocha nessas pessoas uma nova inteligência preservacionista, que nega à quantidade da matéria a possibilidade de conceder felicidade e ainda a enxerga como obstáculo para uma vida mais plena de satisfação. O minimalismo tem no ensinamento do Mestre Jesus seu fundamento, sua inspiração: “Se queres ser perfeito, vai, vende os teus bens, dá o dinheiro aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me”.

E no substrato desse fenômeno de “quanto menos, melhor” se traça uma via para a humanidade seguir sem se extinguir.

A teoria do filósofo grego Epicuro, que no século III antes de Cristo defendia a ataraxia, palavra grega que identifica um estado de imperturbabilidade, de ausência de inquietação, uma serenidade do espírito e de equilíbrio emocional controlando paixões e desejo.

Ataraxia, ou a conquista da felicidade interior, imaterial, ao alcance de todos. Aquela que o praticante de ioga, em cada vez maior número, procura em silêncio.

Por Vittório Mediolo – Jornal O Tempo – BH




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