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Artigos • 17 abr, 2025

A doce magia da Páscoa


por Célio Heitor Guimarães –

No meu tempo de criança, que já vai longe, a Páscoa sempre me emocionou mais do que o Natal. Nunca soube bem porquê. Talvez pela presença daquele coelhinho mágico, que ninguém via, mas que trazia gostosos chocolates para a gente e ainda se dava ao trabalho de escondê-los, sabendo que procurá-los e encontrá-los fazia a alegria da gurizada. Ele não vinha do Polo Norte, a bordo de um trenó aéreo, puxado por parelhas de renas, como Papai Noel. Era daqui mesmo, vivia na sua toca de endereço desconhecido e adorava uma cenoura.

Sempre que a Páscoa se aproxima, lembro-me da cronista e historiadora catarinense Urda Alice Klueger, que, com uma saborosa crônica de alguns anos atrás, remeteu-me de volta à infância ao registrar toda a magia da data.

Na Blumenau de Urda, a Páscoa começava alguns meses antes. É provável que não seja mais assim, porque desgraçadamente a modernidade e a globalização também já chegaram ao belo Vale do Itajaí. Mas, naquela saudosa época, nas casas dos descendentes de alemães, poloneses e ucranianos, as mães passavam a quebrar os ovos de galinha com todo o cuidado, só a pontinha de cada ovo, armazenando as cascas vazias. Depois, cada casquinha era decorada de forma diversa, sendo pintada com tinta a óleo ou guache, ou coberta com papel de seda. Aí, dentro de cada ovo vazio depositava-se uma boa quantidade de amendoim. Como o amendoim era então vendido em quilo, cru e com casca, necessário se fazia descascá-lo, torrá-lo e tirar-lhe a pele para que as mães, tias ou avós pudessem confeitar os grãos com calda de açúcar. Uma vez cheias, as casquinhas dos ovos eram vedadas com estrelinhas de papel, coladas com cola de farinha de trigo.

Não me lembro desse costume na Lapa da minha infância ou na Araucária da minha meninice. Mas lembro-me – e como! – do interesse com que nós acompanhávamos, na véspera da Páscoa, nossas mães, tias ou avós na tarefa de confeccionar as cestinhas de papelão, caprichosamente enfeitadas com tiras de papel crepom multicolorido e forradas com papel picotado, palha ou capim. Cada criança ganhava a sua. Já existiam as cestinhas de vime, também artesanais, mas a petizada preferia mesmo as de papelão, compostas com pequenas alças do mesmo material. Depois, eram deixadas sobre as mesas à disposição do misterioso coelhinho noturno.

Na Blumenau da Urda Alice, faziam-se, também, ovos cozidos pascais: colava-se folhinhas de avenca, de rosa, etc., com clara de ovo, em ovos frescos, que eram introduzidos em pequenas trouxas de pano e depois cozidos em água com plantas que lhes davam cor. Esses ovos eram servidos no café da manhã da Páscoa.

Ah, as manhãs de Páscoa!… Como relembra Urda, “o despertar das manhãs de Páscoa era uma loucura”. A criançada corria pela casa ou fora dela, ainda de pijama, à procura do que o coelhinho havia deixado. O início de outono e o frescor de abril aumentavam o friozinho de ansiedade dos nossos estômagos e a visão das coloridas cestinhas repletas de guloseimas, atrás de um móvel ou entre os tufos de capim do jardim e até mesmo no alto de um galho de árvore, completavam o cenário de pura magia.

Agora, infelizmente, aqui e em Blumenau, o cenário é bem diferente. A data ainda encanta. Bernardo, meu bisneto, de 5 anos, há dias não fala de outra coisa. Mas, tanto quanto muito pouca gente ainda lembra o significado religioso da Páscoa, marcada pela ressurreição de Jesus, o personagem maior do cristianismo, a sociedade de consumo nos distancia cada vez mais de nossos sonhos. O progresso matou o coelhinho da Páscoa e poucos são os pais, as tias ou os avós que ainda preparam cestinhas de papel encrespados para as crianças.

Hoje, como também diz Urda Alice Klueger, preferem levá-las aos supermercados para que elas próprias escolham os chocolates da sua marca favorita.




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