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Artigos • 06 set, 2021

Aos jacarandás em flor


(José Isaac Pilati – da Academia Catarinense de Letras) –
Fiquei profundamente tocado com a homenagem prestada aos profissionais de
saúde e às vítimas da Covid-19, na cidade de Maravilha-SC. Plantaram o: Bosque da
Memória, nos altos do Seminário. Próximo do céu, Rua do Contestado, guerra ao
olvido. Na Cidade, que pretendemos eterna, setenta árvores de jacarandá devotadas a
reflorescimento em oração e perfume. Jacarandá é termo de origem tupi-guarani
(bignoniaceae para a ciência); árvore nativa, que e a exemplo do cedro-rosa e da
araucária, possui a madeira compacta, e vive em torno de 500 anos, a idade do Brasil.

Vem da antiguidade essa devoção que temos pelas árvores longevas; havia
rituais populares na presença delas. Num sentimento de respeito, por saber que elas
sobreviverão a nós todos, e por guardarem elas no lenho a nossa amizade, a dor e as
alegrias da poucas primaveras, que nos são dadas sobre a terra. Conforta saber,
também, que os antepassados ali estiveram, compartilharam com ela o sonho da
longevidade, seus segredos e angústias. A árvore mais velha do mundo está nos
Estados Unidos, um Pinus longaeva, mais velho que as próprias pirâmides do Egito.

São como raros monges do tempo, a exemplo de um cipreste no Chile, uma
figueira no Sri Lanka e uns Gingkos chineses; distinguem-se pela madeira resistente a
insetos, fungos, pestes, e são protegidos por uma capa de resina. Mas o segredo maior é que
elas não estão programadas para morrer, como as demais espécies nativas, os animais e nós
humanos. Na floresta densa e na natureza em geral, é o contrário, impera a solidariedade, a
exemplo das estrelas, de cujos restos mortais surgem planetas e novas estrelas: das velhas
árvores dependem miríades de espécies e plantas, que diversificam e renovam a própria vida.

A vida humana só se completa com a morte, e a questão difícil dos tempos modernos,
em verdade, é que a enfrentamos, basicamente, no plano do indivíduo; quando um dos
segredos da grandeza romana, por exemplo, está na forma como lidavam com ela: plantada
na religião, mas à semelhança de árvore, ligada à própria fundação; a ressignificar a cada
geração, no plano do populus, com exéquias e símbolos – a urbe. O gesto da autoridade com o
Bosque da Memória, em Maravilha, vai nessa direção: plantar a dor para que ela floresça
perene, viva a cada nova primavera, aos olhos da cidade, num recanto de paz, próximo do céu.




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