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Artigos • 07 maio, 2022

A Guerra da Ucrânia não tem fim e massacra civis enchendo o país de armas


(por Mario Sergio Conti) – 

Decantado poder de fogo da Rússia, heroica resistência ucraniana e sanções econômicas fracas arrastam o conflito

Com mais de dois meses, a Guerra da Ucrânia já não gera manchetes. Mas se tornou mais letal e ameaçadora. A cada dia que passa, o pavio que foi aceso se aproxima de um paiol atulhado de bombas —hiperinflação, desordem na economia mundial, recessão—, inclusive nucleares.

Apesar dos bombardeios diários, as estradas e ferrovias ucranianas estão engarrafadas. Mais de 4 milhões de mulheres, velhos e crianças fugiram do país —os homens de 18 a 60 anos são obrigados a ficar e lutar. Outros 4 milhões de pessoas, para sobreviver, mudaram de cidade no interior da Ucrânia.

É o maior movimento de massas no mundo desde a Segunda Grande Guerra. E atenção, feministas: raras vezes, na história, as mulheres foram tão atacadas. Cabe unicamente a elas trabalhar, arrumar sustento e abrigo para os filhos. Sem dinheiro e em países nos quais não falam a língua.

O congestionamento é nos dois sentidos. Enquanto milhões de pessoas fogem das bombas e tanques, trens e caminhões cheios de tanques e bombas entram na Ucrânia. A União Europeia e os Estados Unidos dizem que é urgente parar a guerra. Contudo, entopem o país de armas.

Elas não visam à paz, mas que o pavio da guerra continue a queimar. O próprio Biden admitiu que há oficiais americanos no teatro de guerra. Países europeus enviaram “técnicos” para ensinar os ucranianos a usar helicópteros, mísseis, metralhadoras e drones.

O conflito está virando uma guerra por procuração —aquela na qual potências usam tropas de um país para atacar outra potência. Seria a União Europeia e os Estados Unidos de um lado e a Rússia de outro, e os ucranianos como vítimas.

O serviço de informações chinês afirmou que, com o país abarrotado de armas, elas estão sendo vendidas por batalhões ucranianos a quem se interessar. Foi o que ocorreu quando Sadam e Kadafi foram derrubados: o Iraque e a Líbia ficaram à mercê de milícias e se fragmentaram.

Pelas profecias dos autoproclamados especialistas, a guerra seria vencida por Putin num zás-trás. Não anteviram três fatos. Primeiro, o decantado poder de fogo da máquina russa de matar se revelou um traque. O avanço foi frouxo, empacou e retrocedeu em Kiev.

A segunda bola fora diz respeito ao ponto nevrálgico da arenga de Putin para justificar o ataque: a Ucrânia não é uma nação. E se viu que o sentimento nacional ali é formidável, apesar das diferenças étnicas e linguísticas. Ele é o fundamento da resistência heroica à invasão.

Esse nacionalismo, de raízes entranhadas na Idade Média, tem contrapartida militar. Na guerra da Crimeia, na Revolução Russa, na Primeira e na Segunda Guerras Mundiais, dos cossacos à ocupação da praça Maidan —os ucranianos sempre foram tidos por combatentes aguerridos, ferozes.

Por fim, as sanções econômicas. Os especialistas imaginaram que elas levariam Putin a parar a guerra logo. Ledo engano. Para serem eficazes, elas teriam de ser duríssimas, o que tumultuaria a ordem mundial. A economia russa é grande demais para naufragar sem provocar consequências imprevisíveis.

Um esboço dessas consequências é visível na Europa. A inflação e a deterioração súbita do poder de compra fazem com que os governos pró-guerra venham perdendo popularidade. O exemplo mais evidente é o do presidente Emmanuel Macron, da França.

Ele foi reeleito porque, entre outros motivos, posou de estadista ao negociar com Putin. Não obteve nada. De modo que, nas eleições legislativas de junho, pesquisas mostram um quadro bem diverso. É do interesse dos povos —dos europeus e ucranianos, dos americanos e russos— que venha a paz e as tropas de Putin deixem o país.

Um dos cenários antevistos pelas chancelarias é que Putin, em vez de continuar o massacre indefinidamente, e sem qualquer garantia de vitória, decrete o fim da guerra. Com a Ucrânia dividida, cantaria de galo, de grande vitorioso. Há precedentes, mas com resultados antagônicos.

A França, e depois os Estados Unidos, invadiram e dividiram o Vietnã em dois países por 20 anos. Só em 1975 os vietnamitas venceram a guerra e reunificaram o país. A propósito da invasão americana, o presidente Lyndon Johnson disse em 1965: “A vitória final dependerá dos corações e mentes das pessoas que realmente vivem lá”. Foi o que ocorreu.

No final da Segunda Guerra, o Japão foi expulso da Coreia. A União Soviética ocupou o norte do país e os EUA invadiram o sul. Os coreanos não foram consultados. A Coreia, que era um país, segue dividida em dois.

*Publicado na Folha de S. Paulo




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