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Artigos • 12 ago, 2021

Paulo José, adeus


(por Inácio Araújo, na FSP) – 

Paulo José foi um porto seguro quando cinema era uma arte insegura

Morto nesta quarta, ator monumental era sempre ele mesmo e outra pessoa em diferentes filmes

Não é difícil perceber a importância de Paulo José, que morreu nesta quarta aos 84 anos, para o cinema brasileiro. Desde a sua estreia, que se deu em “O Padre e a Moça”, de Joaquim Pedro de Andrade, em 1965, ele já se fazia notar.

Ainda que o filme fosse notável, o personagem do angustiado padre que se apaixona por uma garota no interior mineiro, papel de Helena Ignez, não fez o sucesso merecido.

O que vem a seguir não desmente o anterior. Paulo José soube fazer rir com “O Homem Nu”, de Roberto Santos em 1968, ou como “Macunaíma”, em 1969, novamente com Joaquim Pedro. Entre os dois, foi capaz de sofrer as violências da política numa ditadura, em “A Vida Provisória”, de Maurício Gomes Leite.

Assim como “Bebel”, de Maurice Capovilla, ou “As Amorosas”, de Walter Hugo Khouri, todos esses eram bons filmes, no pior dos casos. E em parte porque o ator era ele. Sua capacidade de imprimir vida aos personagens, trágicos, cômicos, amargos, o que fosse, já havia se mostrado até aí. E sua carreira mal havia começado.

É verdade que o aperto ao cinema no começo dos anos 1970 fazia o trabalho na TV mais atraente, mas Paulo José nunca deixou o cinema. A partir dessa época, os filmes oscilaram bastante. O ator continuou a ser uma espécie de porto seguro de uma arte tremendamente insegura, vergastada por coisas como censura e falta de dinheiro.

No mesmo ano, aparece em “Anahy de las Misiones”, notável e subestimado filme de Sergio Silva sobre uma família que vive de despojar os mortos da Guerra Cisplatina, durante o Primeiro Império. Era também uma oportunidade de voltar a trabalhar no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1937.

Estávamos ainda nos tempos da retomada e o cinema brasileiro se preparava para entrar em sua grande fase, neste século. Uma boa entrada nesse novo período seria trabalhar com Jorge Furtado, diretor também gaúcho, frequente também na TV, e com quem estaria em um papel marcante de “Saneamento Básico”, de 2007.

Com a idade, os melhores papéis são mais raros, é verdade. Mas Paulo José também conviveu com a doença de Parkinson desde 1993, sem nem por isso deixar de se mostrar soberbo, como no “Quincas Berro d’Água”, de 2010.

Um ano depois, faria “O Palhaço”. Seu último grande papel, sem dúvida, mas sobretudo uma tremenda homenagem que era prestada a ele pelo outro palhaço da história, Selton Mello, por sinal diretor do filme e também ótimo ator.

Paulo José morre aos 84 anos, depois de ser premiado onde quer que tenha concorrido na categoria de melhor ator no país. Foi galã e ator, foi ele mesmo e sempre outro a cada filme. Não sou dado a hipérboles, mas é inegável que o cinema brasileiro perdeu um monumento.




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