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Artigos • 14 nov, 2021

PT de salto alto leva água para eventual reeleição do capitão


(por Elio Gaspari ) – 

Se o gabinete do ódio quisesse redigir duas notícias falsas sobre a eleição da Nicarágua, não faria melhor

A um ano da eleição, Lula lidera com folga as pesquisas e vive uma maré de sorte, com a desidratação de Bolsonaro e uma terceira via que tem sobra de nomes e escassez de ideias.

Prever resultado eleitoral antes que a campanha imponha sua dinâmica é algo como buscar sinais de vida em Marte. Apesar disso, o comissariado petista subiu num salto alto e teve uma recaída do negacionismo que já lhe custou a perda do mandato de uma presidente.

Aos fatos:

No último domingo o presidente Daniel Ortega, da Nicarágua, reelegeu-se pela quarta vez. Tem a mulher como vice e durante a campanha o governo prendeu sete postulantes.

Nos últimos anos o regime sandinista produziu centenas de mortos e milhares de expatriados. Coroando esse processo, conseguiu 76% dos votos.

Na segunda-feira, o secretário de relações internacionais do PT, Romênio Pereira, saudou o evento dizendo o seguinte:

“Os resultados preliminares, que apontam para a reeleição de Daniel Ortega e Rosario Murillo, da FSLN [Frente Sandinista de Libertação Nacional], confirmam o apoio da população a um projeto político que tem como principal objetivo a construção de um país socialmente justo e igualitário.”

Em agosto passado, quando Ortega começou a baixar o chanfalho na oposição, Lula se afastou do companheiro, defendendo a alternância de governantes no poder.

Parecia que o comissariado se dissociaria das ditaduras de esquerda, mas a nota mostrou que há no PT correntes que vão no sentido oposto. Até aí, seria o jogo jogado, com um secretário de relações internacionais pensando de um jeito e o guia pensando de outro.

Na quarta-feira, a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, publicou uma mensagem esclarecendo a questão em linguagem telegráfica:

“Nota s/ eleições na Nicarágua ñ foi submetida à direção partidária. Posição PT em relação qq país é defesa da autodeterminação dos povos, contra interferência externa e respeito à democracia, por parte de governo e oposição. Nossa prioridade é debater o Brasil c/ o povo brasileiro.”

Piorou. A doutora tratou de um aspecto burocrático da nota de louvor a Ortega. Ela não foi submetida “à direção partidária”. E se fosse? Ademais, o secretário de relações internacionais tem direito de falar sobre questões internacionais.

A última frase (“nossa prioridade é debater o Brasil c/ o povo brasileiro”) não quer dizer nada.

Quem glorificou Ortega foi o comissário Romênio Pereira e, se a ditadura nicaraguense, corretamente, não é uma prioridade para o PT, ele pode ficar calado. Tendo falado, ao colocar a questão nesses termos, a doutora sugere que pretende blindar o tema.

Má ideia, sobretudo porque Lula está numa viagem de dez dias a Alemanha, Bélgica, Espanha e França.

“Nosso Guia” pretendia mostrar aos europeus que o Brasil não é Bolsonaro. Que não seja, mas resta saber qual é o Brasil do PT. Que não é o de Daniel Ortega, isso se sabe, pois ficou 13 anos no poder sem praticar os atentados contra as liberdades públicas que Ortega praticou em poucos meses.

O Brasil de Lula desembocou na crise de 2016 porque o negacionismo do comissariado contaminou seu organismo.

Flertando com os Castro em Cuba, com Hugo Chávez na Venezuela e com Muamar Kadafi na Líbia, o comissariado ajudou a produzir Bolsonaro.

Subindo num salto alto um ano antes da eleição, leva água para uma eventual reeleição do capitão.

Se o gabinete do ódio quisesse redigir duas notícias falsas sobre a eleição da Nicarágua, não faria melhor.

*Publicado na Folha  de S.Paulo




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