Não tenho sido otimista quanto à Peste que assola o mundo, nem quanto a suas interpretações, boazinhas, irônicas, apavoradas ou talvez afoitamente racionais.

Não sei bem o que pensar, como boa parte das pessoas, aliás. Às vezes me queixo da longa fase de isolamento em casa, mas obedeço fielmente, com máscara, distanciamento, álcool gel, porque nem quero adoecer, nem quero fazer outros adoecerem. Oscilo entre bem-humorada e um pouco emburrada, ah, sim, aquela criança está em nós com qualquer idade, que bom.

Aos poucos, porém, começaram a sair do susto paralisante e a reparar em alguns benefícios, coisas com que há muito não contavam: o mar sem nenhuma poluição, praias limpas (poucos restos, garrafas vazias ou sacos plásticos), peixes retornando, sossego, silêncio, sensação de unidade com aquela natureza incrível que não conseguiam mais curtir. Pois antes viviam correndo, trabalhando, servindo a milhares de turistas que na verdade os sustentavam.

Perceberam, lentamente, que podiam viver sem a invasão permanente de estrangeiros felizes e encantados dançando ao som de hábeis DJs. Começaram a plantar suas hortas, a cuidar uns dos outros, e se reunir, a ser uma comunidade. Com menos coisas, menos pequenos luxos, mas muito mais tranquilidade e alegria. Os turistas que recomeçaram a aparecer muitas vezes não vinham só por alguns dias agitados, mas ficavam semanas ou mais, fugindo da contaminação para algo mais seguro.

E, assim, ressurgiram hábitos, talentos, possibilidades, que haviam esquecido na correria diária com as manadas de turistas, boas mas não essenciais.

De alguma forma, esse vídeo me alegrou, me trouxe a velha Senhora Esperança, tão necessária, que em geral fundamentou minha vida, mas andava meio frágil nestes dias. Me fez pensar que talvez meu relativo pessimismo quanto a uma humanidade pós-pandemia – se houver um pós-… – não seja de hostilidades pessoais, ou países e cidades fechados, caras fechadas também, suspeita, desconfiança, acusações mudas ou não, “não chegue perto, não venha, não me traga a doença”. Mas, aos poucos, ao menos em alguns lugares, a gente será mais gentil, mais tranquilo, mais modesto, menos competitivo, menos louco, menos cobiçoso, menos inquieto e menos infeliz. Que os imensos edifícios se transformem de formigueiros frenéticos em moradias, com terraços cheios de plantas, e crianças nos pátios. Quem sabe alguns se dividam entre escritório e lar. Quem sabe, quem sabe, tudo não vá ser tão melancólico ou perigoso como, nos meus pressentimentos menos cor-de-rosa, tenho receado.

Senhora Esperança, bem-vinda.

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