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Artigos • 28 abr, 2022

A morte com prescrição


É mais um daqueles rankings que nos obrigam a esconder a cara. Um levantamento realizado por órgãos internacionais em 2021, a respeito da política de drogas em 30 países, situou o Brasil em 30º lugar —atrás do Afeganistão (14º), em guerra há anos, e de Uganda (29º), um dos menores IDHs do planeta. A pesquisa não ficou nos desastres em que somos campeões, como tráfico e repressão. Incluiu também a medição das políticas de controle de saúde e de redução de danos pelos remédios controlados. Nesse item, a Noruega, em 1º lugar, somou 74 pontos; o Brasil, em último, nove.

E esse índice ainda pode piorar, com a revelação da Fiocruz de que 2,9% da população —quase 5 milhões de brasileiros— já usou analgésicos opioides pesados sem prescrição médica; que, nos últimos seis anos, segundo a Anvisa, a venda prescrita desses remédios cresceu 465%; e que isso se deve aos diagnósticos incorretos e irresponsáveis em clínicas e prontos-socorros. Não por acaso, o crescimento dos casos de dependência é nítido nas pesquisas. A reportagem de Cláudia Collucci na Folha de quinta (28) é assustadora.

Quantos médicos saberão identificar tecnicamente um dependente? Quantos não caem a todo instante no golpe da receita perdida, dos pacientes que chegam às emergências simulando dor ou dos que os levam a tratar com opioides doenças crônicas como enxaqueca ou dor lombar? Quantos aprenderam que, para essas pessoas, a droga não é mais para dar prazer, mas exatamente para atenuar os efeitos da abstinência, como taquicardia, hipertensão, sudorese, diarreia, insônia, tudo isso ao máximo grau —e dor?

Um dia, os opioides apresentam a conta, vide Michael Jackson, morto aos 50 anos, Judy Garland (aos 47), Carmen Miranda (46), Elvis Presley (42), Dinah Washington (39), Prince (37) e Jimi Hendrix (27).
Todos bem jovens, não? Mas certas dependências não gostam de esperar por suas vítimas.

*Publicado na Folha de São Paulo 




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