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Artigos • 24 abr, 2020

Regras de substituição do Presidente da República (Francisco Ferraz)


Por que o Presidente da Câmara dos Deputados assume na falta do Vice-Presidente e não o Presidente do Senado, nem do STF?

Esta pergunta diz respeito às regras de substituição do Presidente da República. Para respondê-la primeiro é preciso atentar para o que diz a nossa constituição à respeito desta questão.

A matéria é regulada pelo art. 79 Parágrafo único e art. 80:

Art. 79. Substituirá o Presidente, no caso de impedimento, e suceder-lhe-á, no de vaga, o Vice-Presidente. 

Art. 80. Em caso de impedimento do Presidente e do Vice-Presidente, ou vacância dos respectivos cargos, serão sucessivamente chamados ao exercício da Presidência o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal.

Em primeiro lugar os artigos 79 e 80 falam em ‘impedimento e vacância’ do cargo de Presidente da República. É óbvio que a lei está a indicar que os termos não são sinônimos. Por impedimento entenda-se um afastamento temporário do exercício da função, enquanto a vacância se refere a um afastamento definitivo.

Em caso de impedimento o Presidente é substituído no exercício de suas funções pelo Vice-Presidente, ou no impedimento deste, das demais autoridades previstas na linha sucessória, enquanto durar o impedimento.

Em caso de vacância que implica na impossibilidade definitiva de exercer o cargo por cassação, renúncia ou morte, diz-se que o presidente é sucedido pelo Vice-Presidente, havendo duas hipóteses: (1) Se a vacância ocorrer na primeira parte do mandato presidencial far-se-á eleição em 90 dias; (2) Se na segunda parte do mandato o vice-presidente assume até o fim do período de mandato. Neste caso, o Vice-Presidente, ao suceder o antigo chefe de Estado, torna-se o novo Presidente e segue como tal até o final do mandato previsto.

Pode, entretanto, ocorrer que haja uma dupla vacância, isto é que tanto o Presidente da República como o Vice-Presidente estejam definitivamente impedidos de exercer as funções de Presidente da República.   Embora se trate de uma sucessão, a ocupação da Presidência se abre então para a linha sucessória constitucionalmente prevista, sucessivamente e na seguinte ordem: Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente do Senado Federal, Presidente do Supremo Tribunal Federal.

A sucessão pela “linha sucessória” diferentemente daquela por via do Vice- Presidente é sempre provisória. Qualquer que seja o sucessor tem o compromisso constitucional de convocar novas eleições (se a dupla vacância ocorrer nos dois primeiros anos do mandato) ou de realizar eleições diretas entre os parlamentares (se a dupla vacância ocorrer na segunda metade do mandato). Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período de mandato dos seus antecessores.

A pergunta, entretanto se refere à linha sucessória e ao fato de que o Presidente da Câmara tem prioridade sobre o Presidente do Senado Federal na hipótese de substituição do Presidente e/ou do Vice-Presidente. À primeira vista se suporia que a ordem sucessória reconheceria o Presidente do Senado acima do Presidente da Câmara o que não sucede. Qual a razão?

A questão se refere ao Poder Legislativo que se subdivide em duas casas: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. A teoria constitucional define a Câmara como sendo a casa da representação popular e o Senado como a casa da representação dos estados da federação.

Por causa desta divisão de representações as duas casas se diferenciam: em número de membros (513 deputados 81 senadores); em anos de mandato (4 anos para deputados 8 anos Senadores); forma de eleição (proporcional – Câmara; majoritária – Senado); atribuições e competências. A própria definição constitucional de cada uma das casas já indica as razões para a preferência da Câmara sobre o Senado em matéria de substituição do presidente:

Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

Art. 46. O Senado Federal compõe-se de representantes dos Estados e do Distrito Federal, eleitos segundo o princípio majoritário

três poderes
Praça dos Três Poderes – Brasília

Num sistema democrático com eleições diretas para a Presidência da República a Câmara dos deputados possui maior legitimidade popular que o Senado, já que é o órgão de cúpula do Poder Legislativo mais próximo do eleitor.

Esta é a razão básica para a prioridade atribuída ao Presidente da Câmara dos deputados por decisão constitucional ser convocado para substituir o presidente da república em seu impedimento ou vacância, quando o vice-presidente também estiver impossibilitado para assumir.

Não obstante essa preferência constitucional, presente sempre nos regimes presidenciais de governo, o Senado possui atribuições exclusivas e de elevada hierarquia como: seu presidente dirigir os trabalhos das sessões do Congresso Nacional (Câmara + Senado); aprovar os Ministros do STF indicados pelo presidente da república; processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade (impeachment);  aprovar previamente, por voto secreto, após argüição em sessão secreta, a escolha dos chefes de missão diplomática de caráter permanente.

Essa condição peculiar do Senado em relação à Câmara de Deputados, deve-se à tradição do regime presidencialista, que concebia o Senado como uma casa mais conservadora (por isso o mandato mais longo, para assegurar sua maior independência dos humores do eleitorado) e a Câmara uma casa mais próxima da vida política do momento presente (por isso mais sujeita às pressões e reivindicações populares). Como as duas casas constitucionalmente são iguais em poderes (lei para vigir deve ser aprovada por ambas) esperavam os legisladores da época que produzissem um equilíbrio dinâmico – uma controlando a outra e ambas sendo conduzidas para um acordo.

Entretanto, quando se tratar de substituição do Presidente da República a casa com maior proximidade do eleitor sempre terá mais legitimidade. Essa a razão básica para a preferência dada a Câmara, por meio de seu presidente, para suceder o Presidente da República nas hipóteses previstas em lei.

Em 9 de agosto de 1974 Gerald Ford, presidente da câmara dos deputados dos EUA assumiu a presidência da república substituindo Richard Nixon que renunciou à presidência, em razão do escândalo de Watergate. Ford assumiu como presidente da Câmara por que o Vice-Presidente de Nixon, Spiro Agnew que havia renunciado ao cargo.




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