Campo Grande, 29/04/2024 05:26

Blog do Manoel Afonso

Opinião e atitude no Mato Grosso do Sul

Artigos

Artigos • 08 nov, 2023

Tevê à la carte


(de Carlos Castelo) – 

Quando garoto, tinha presença constante em meus sábados o tradicional “Almoço com as Estrelas”, na extinta TV Tupi. Era soar o prefixo com a música “Summer of ’42” e todos disparavam em direção à sala com seus pratos de comida e talheres nas mãos.

O cenário do programa ficava repleto de mesas onde os convidados de Airton e Lolita Rodrigues, feito a gente em domicílio, almoçavam placidamente.

A atração ia ao ar das 12h30 às 16 horas e contava com a chancela comercial da cantina Don Ciccillo. Entre um coquetel de camarão e um cuscuz paulista que passavam diante das câmeras, algum artista vinha até o microfone e entoava um playback meloso.

Esse artista podia ser Agnaldo Rayol, Benito de Paula, Vanusa, Nelson Ned, Perla, Francisco Petrônio, entre tantos. O momento mais aguardado, todavia, era presenciar Lolita Rodrigues cantando. Sempre que a atriz soltava seus trinados, minha mãe repetia a mesma coisa:

– Ah, o que mais gosto de ver é a cara de apaixonado que o Airton faz pra ela…

Mesmo ainda muito criança, eu não acreditava que um ser humano pudesse expressar afeição a outro ser humano em meio a refletores, contrarregras, sonoplastas e, especialmente, o bufê do Don Ciccillo – para mim, já à época, uma comida não muito palatável. Mas as mulheres de casa invariavelmente suspiravam no momento do solo de Lolita.

Talvez fosse por influência da decoração de trattoria, mas sempre achei Airton com mais cara de maître do que de apresentador de tevê. O terno branco, a calva, a modulação da voz. Francamente, nunca julguei ideal aquela harmonização de gerente de cantina com uma cantora romântica como Lolita.

Como era um ritual sagrado assistir ao “Almoço com as Estrelas”, e menores de idade não tinham voz em casa, acabei me rendendo ao espetáculo. Na real, preferiria ver “Jonny Quest” ou “Perdidos no Espaço” do que Altamiro Carrilho tocando flauta ao lado de uma travessa cheia de estrogonofe. No entanto, só havia um televisor em casa. E, aos sábados, o aparelho estava reservado para Airton e Lolita. Vi tanto que aprendi a gostar. No fundo, pensando bem, era até bem melhor do que o “Clube do Bolinha”.

(Publicado na revista Fórum)




Deixe seu comentário